sábado, 20 de agosto de 2011

Touros, o palco da história

Há 510 anos desbravadores de além mar descortinavam Touros


Pouca gente sabe, mas há 510 anos, no dia 7 de agosto de 1501, aconteceu, em terras potiguares, um dos mais importantes fatos históricos do país: a fixação do primeiro Marco de Posse colonial da terra brasileira por Portugal, fato que para muitos historiadores, representa o registro de nascimento do Brasil.
O dia 7 de agosto foi instituído como sendo o aniversário do Estado do Rio Grande do Norte, de acordo com a lei 7.831, de 30 de maio de 2000, de autoria do ex-deputado Valério Mesquita e sancionada pelo então governador Garibaldi Alves Filho. A sugestão da comemoração partiu do historiador Marcus César Cavalcanti e do presidente do Instituto Histórico e Geográfico do RN, Enélio Petrovich.
“Considero a fincagem do Marco de Posse o fato mais importante não só da história do RN, como também da história do país, porque esse fato representa o nascimento jurídico do Brasil e marca a primeira presença física portuguesa em território brasileiro”, disse na época o então governador do Estado, Garibaldi Filho.
Apesar da importância a data vem passando despercebida. De acordo com o historiador, Câmara Cascudo, em 1928, uma reportagem foi publicada sobre o tema, mas caiu no esquecimento. Em 1962, o historiador Oswaldo de Sousa também defendeu a importância do Marco e cobrou mais atenção pelo monumento. Mas só em 1976, o Marco foi retirado do seu local original, a praia de Touros, para o Forte dos Reis Magos, onde se encontra até hoje.
O primeiro desembarque dos colonizadores portugueses deu-se em 1501, quando a expedição de Gaspar de Lemos chantou um marco colonial na Praia de Morros. Esta pedra, mais conhecida como Marco de Touros, é considerado o monumento mais antigo do Brasil. O segundo desembarque dos portugueses ocorreu no século XVII, quando uma expedição organizada para combater os holandeses comandada por Luiz Barbalho Bezerra, não podendo desembarcar em Recife, aportou na enseada de Touros, deixando para trás vários canhões, três dos quais se encontram hoje no município. No século XVIII, quando os portugueses começaram a se fixar definitivamente, chegou à região a imagem do Bom Jesus dos Navegantes, padroeiro do município, cuja origem é desconhecida, não se sabendo se veio por mar ou por terra, se foi promessa ou doação.
A construção de sua capela, hoje matriz do Bom Jesus dos Navegantes foi concluída em 1800. Em 1912, foi construído o primeiro Farol do Calcanhar, reformado em 1943, em plena Segunda Guerra Mundial é hoje o mais alto da América Latina e marca singular do litoral norte do Estado. O imponente farol se destaca pela sua presença arquitetônica. Com seus 62 metros de altura podendo ser visto dos mais longínquos recantos da região, sobretudo a noite quando sua forte luminosidade faz varreduras no mar.

O MARCO DE TOUROS
O Marco de Posse, mais conhecido como Marco de Touros é o mais antigo marco colonial em território brasileiro e sua fincagem foi o primeiro acontecimento histórico no território potiguar e também o evento oficial de posse do país. Outros Marcos foram deixados no litoral brasileiro, um no litoral baiano e outro na praia da Cananéia, São Paulo, sendo o de Touros o mais antigo.
Hoje ele encontra-se exposto permanentemente no Forte dos Reis Magos. Feito em pedra lioz, o marco mede 1,62 metros de altura, 32,5 centímetros de largura e 25 centímetros de espessura. Traz esculpido no primeiro terço, a Cruz da Ordem de Cristo (a famosa Cruz de Malta) e, abaixo, as armas do rei de Portugal. Ele foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Cultural. Em 1976, foi retirado de forma forçada da comunidade pelo representante do Instituto do Patrimônio Histórico e Artísticos no rio Grande do Norte (IPHAN), Oswaldo de Souza. No lugar do original, existe uma réplica que mantém a tradição, os mitos e a crença religiosa do povo.
Atualmente o Marco de Touros se encontra na Fortaleza dos Reis Magos - o lugar menos indicado para sua conservação - de onde um dia voltará, certamente, ao sítio primitivo, como manda o bom censo, desde que sejam criadas as indispensáveis condições de segurança e acessibilidade ao monumento.

O BRASIL NASCEU MESMO EM TOUROS?
Famoso por sustentar o fato de que a descoberta de Pedro Álvares Cabral, além de não ter sido a primeira expedição marítima a aportar em terras brasileiras, foi feita não em Porto Seguro e sim aqui no Rio Grande do Norte, o pesquisador e historiador Lenine Pinto afirma que comemorar o dia do Estado em sete de agosto é um erro. "O dia mesmo, documentado pelo diário de bordo da expedição de Gaspar de Lemos e André Gonçalves, é o dia 17. Porém, como os navegantes da época utilizavam-se do "dia náutico" a data exata da colocação do marco em Touros é de 16 de agosto de 1501", afirmou Lenine Pinto. No livro Efemérides Brasileiras, escrito pelo Barão do Rio Branco, a data de registro da colocação do marco de pedra lioz em terras potiguares é a mesma que o historiador potiguar afirma.
Para Lenine, a presença do navegador italiano Américo Vespúcio na expedição não é algo que deva ser exaltado. "Ele era um canalha de marca maior. Falsificou documentos de viagens, ludibriando cartógrafos e ainda consegui ser homenageado tendo o nome servido de inspiração para todo um continente", afirmou Lenine. Amparado em pesquisas realizadas por várias décadas, o historiador conta que, além de Cabral não ter aportado na Bahia, outros navegantes portugueses e espanhóis teriam passado pelo litoral do que hoje é o RN, antes mesmo de 1500.
"Há inúmeros indícios e, em alguns casos, provas documentadas de que Vasco da Gama, Cristóvão Colombo e Bartolomeu Dias teriam passado pelo litoral do Estado. Alguns deles, como Vasco da Gama, teriam até aportado e passado algum tempo em terras potiguares", afirma Lenine. Segundo ele, já em meados de 1480, Bartolomeu Dias teria tomado conhecimento das terras do que hoje é o Brasil - incluindo uma passagem pelo Rio Grande do Norte - e teria apontado o caminho para o litoral do Nordeste, em um trecho compreendido entre o RN e a divisa entre Pernambuco e Alagoas, conhecido como Caminho do Sudoeste. A partir deste apontamento, o português Vasco da Gama passou entre três e quatro meses por volta de 1498.

Segundo Lenine, a Lei de Sigilo de Portugal que vigorava na época impedia que estes casos fossem devidamente registrados, apesar de haver cartas e documentos que confirmam para estas histórias. "A versão oficial aponta Cabral como o primeiro a chegar no Brasil e na Bahia, mas inúmeros documentos apontam ao contrário, nos dois casos. Os historiadores, por muitas vezes, são desatentos e esquecem de ler as entrelinhas", finalizou Lenine.

Fonte: Sebastião Silva //
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